quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Todo mundo quer o bônus, mas na hora do ônus...


Essa é uma idéia que sempre me recorre à mente. Noto que nossa sociedade tem se tornado cada vez mais imediatista. E falo aqui de imediatismo em tudo, não apenas nos negócios, na transferência de dados pela internet, mas em tudo mesmo.
Ninguém quer mais sentar para aprender nada, ou pelo menos aprender algo com maior profundidade. Observei isso com mais frequência enquanto professor de música. Quantas vezes ouvi declarações do tipo: "Acho música muito lindo, adoraria tocar um instrumento, mas tem que ter o dom, né?". Quanto ao dom, até acho pertinente, mas não da maneira como se recorre a esse chavão, usando-o como desculpa/justificativa para tudo.
Dentro da minha experiência, noto que a maioria das pessoas quer apenas o bônus* que tocar um instrumento (ou desenhar, ou dançar, ou qualquer outra coisa) pode trazer, mas ninguém quer pagar o ônus que o instrumento cobra para se permitir dominar.
Onde eu quero chegar com isso? O interessante é que isso não ocorre apenas na música, mas em todos os aspectos da nossa sociedade atual. Quando se quer emagrecer, toma-se remédio, faz-se lipo e/ou cirurgia de redução do estômago. Tem problema no juízo? Toma um tarja preta. E por aí vamos..., querendo comprar a solução para nossos problemas, buscando fora de nós a resposta mágica para tudo. Aposto que se inventassem uma pílula para solos de guitarra, dificilmente existiria o jogo Guitar Hero.
Além do imediatismo impelir as pessoas a uma acomodação, também faz de nossa cultura algo cada vez mais descartável. Peguem as músicas, os filmes, novelas, muitos dos livros, etc. estão todos cada vez mais descartáveis. Quantas bandas lançam discos irrelevantes, dos quais a gente não lembra nada depois de um ano? Isso também se reflete no meio acadêmico, em que as teses e monografias estão se tornando cada vez menos relevantes. Faz-se uma pesquisa rasteira, um trabalho qualquer, cuja única função é medir a capacidade do aluno em fazer citações coerentes dentro da norma.
Não quero com isso dizer que sou melhor nem que tenho solução para isso. Muitas vezes me pego também desejando resolver os problemas de forma mágica. Me sinto, sim, tentado a jogar a resposabilidade de certas conquistas pessoais, a objetos compráveis, como se um livro sobre música me fizesse aprender mais apenas pelo fato de comprá-lo e dar uma "lidinha", ou como se o fato de comprar 'AQUELE' lápis fosse tornar meu traço mehor. Quando me pego fazendo isso, procuro me dar uma bronca e colocar meus pés no chão.
É preciso respeitar o tempo, ele é um ótimo professor (pena que, como nos lembrou Berlioz, ele também tem o pessimo hábito de matar todos os seus alunos). A resolução dos problemas vem da prática, não basta comprarmos aquele livro de auto-ajuda, lê-lo rapidamente e tchau. Fazendo uma analogia com música: você pode comprar um livro que descreve detalhadamente uma seqüencia de passos necessários para tocar uma música e ler o livro até decorar, mas ao menos que você já tenha alguma prática em tocar o instrumento, não será capaz de tocar de imediato (pelo menos se for um leigo comum). Obviamente será preciso praticar aquela sequência até incorporá-la.
Da mesma forma acontece nos demais aspectos da vida. Precisamos praticar no dia-a-dia para que hábitos se incorporem a nós, e assim possamos viver aquela mudança. Um gordinho que não pratique controlar a sua boca pode fazer todos os procedimentos que o dinheiro puder comprar, mas fatalmente irá ter problemas com peso no futuro. Resumindo, tudo na vida depende de prática, mas isso custa tempo e nossa sociedade não quer pagar, ao menos na moeda correta, pois nesse negócio tempo e dinheiro são duas coisas diametralmente opostas.

Ps.: não tenho nenhum problema com Guitar Heroes, apenas vejo nesse jogo um sintoma desse nosso imediatismo cada vez mais forte, por isso usei como exemplo.

* quanto ao bônus, só uma pergunta?: qual seria o bônus de tocar um instrumento (ou desenhar, dançar, etc)? Por que tanta gente quando fala dessas habilidades o faz como se fossem verdadeiras habilidades mágicas ou dádivas capazes de, por si só, mudar uma vida? Porque tanta gente tem a tendência de achar que essas habilidades são tão miraculosas assim?

sobre Praticar, quem se interessar, leia esse livro:
Practising: a musician's return to music
Esse livro conta a história de um músico, sobre a questão da prática. É bem interessante para quem é músico, principalmente violonista, mas é interessante para qualquer um que queira refletir um pouco sobre praticar em todos os aspectos da vida.

"Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o!" Nietzsche

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Lei Ficha Limpa

Hoje vou dar uma rapidinha, depois coloco algo mais consistente.
Ultimamente tenho visto no noticiário falando-se muito na coleta de assinaturas para a criação do projeto de lei que proibiria pessoas com pendências judiciais de se candidatar.
Até concordo com a idéia, mas no fundo é uma imensa distorsão. Compara-se essa lei ao SPC, mas é bem diferente. O SPC não proíbe ninguém de comprar nada, nem proíbe nenhum banco de te conceder crédito, ela apenas serve de referência para o vendedor saber se vale o risco vender para fulano.
Acho que seria mais constitucional e até democrático, que ao invés de proibir a candidatura de alguém, mesmo antes do final do processo, que fosse obrigatório que no horário político, candidatos com pendências na justiça mostrassem um selo no canto da tela ou um aviso no fim e no início do horário dele, avisando ao eleitor que esse candidato está sendo investigado ou respondendo à justiça. Se o eleitor votar, risco dele, igual aos bancos que aprovam crédito sem análise, eles estão assumindo o risco.

Vivaldi RV 532 - Concerto para dois bandolins em Sol Maior